Nos últimos 2 dias, sempre que estou em frente à tv e passo por algum canal de notícias vejo uma nota, um flash ou um evento novo sobre a tragédia do vôo JJ 3054.
E alguns fatos me chamaram a atenção.
O primeiro deles me parece óbvio à maioria das pessoas, que é justamente o fato do maior desastre da aviação brasileira ter acontecido em terra firme, ou seja, na verdade não foi um acidente como o que ocorreu com o boeing da Gol, a tragédia do vôo JJ 3054 está mais para um grande acidente automobilístico. Não sei se é apenas uma impressão subjetiva, mas tenho cá pra mim que o avião só é avião a partir do momento em que está no ar, em terra não é nada além que um ônibus gigante com asas, uma zebra sem listras não passa de um cavalo. Alguém mais sarcástico que eu certamente diria que um bom flanelinha poderia ter evitado a tragédia.
O segundo aspecto diz respeito a um comentário, não sei se idiota ou cínico, que vi num matutino da Rede Record. Creio se tratar de um programa de variedades, uma vez que Ana Hickman é apresentadora, custo a crer que ela tenha por hábito tecer comentários sobre política ou economia. Continuando, os demais participantes chamavam o “comentarista” de Brito, suponho que seja esta sua alcunha, um sujeito careca, de óculos e aparência de menino criado pela avó, eis que ele dizia mais ou menos o seguinte, “a que ponto as coisas chegaram, é um absurdo o aeroporto de Congonhas abrir depois do que aconteceu ontem, as pessoas deveriam respeitar as vítimas dessa tragédia, o que falta é sensibilidade (nesse momento ele passa a mão esquerda sobre o braço direito, como se o problema fosse de toque ou pele), será que o capitalismo chegou a esse ponto, em que os negócios não podem esperar e o dinheiro vale mais que vidas humanas?”, seu desgosto não era pela falta de segurança, e sim pelo desrespeito às vítimas. E aqui faço meu ponto, ou é um discurso idiota, uma vez que Brito é incapaz de pensar pessoas viajando por motivos outros que não dinheiro, como por exemplo, uma noiva ou uma filha que vai ver a mãe em estado de câncer terminal, para Brito, tanto o amor quanto a solidariedade terminal são necessidades secundárias diante de tamanha tragédia; ou então trata-se de um discurso cínico, uma vez que, toda manhã, ele está a saborear pratos deliciosos montados por chefes de renome ou se divertindo com matérias sobre biquínis, enquanto milhares de pessoas morrem e sofrem pelas mais diversas mazelas, ou seja, a dor de uns, que rende bom ibope, vale mais que a de outros tantos que penam diariamente no anonimato.
Por fim, uma matéria que vi em algum dos noticiários. Em Porto Alegre, os parentes das vítimas aguardavam a lista oficial dos passageiros que estavam a bordo da aeronave. Gritavam histéricos no balcão da companhia, o que, particularmente, considero uma atitude descabida e auto-enganosa. Descabida pois, uma vez que seu ente querido embarcou no vôo, não há muito que possa ser feito. E chego à questão do auto-engano, o sujeito não grita no balcão pela esperança de que o ente não tenha embarcado, ele grita pela dor antecipada da perda, antes mesmo de qualquer confirmação, o desespero não vem da desinformação, muito pelo contrário, brota da informação já sabida e da recusa em aceita-la. Enfim, após muita confusão, decidiu-se que o melhor a ser feito era levar os parentes das vítimas para o hotel do aeroporto. Após algumas horas de espera, todos se reuniram no auditório do hotel para a leitura oficial dos passageiros que embarcaram no vôo. Num dado momento fez-se a leitura de determinado nome, um sujeito se ergue, leva as mãos à cabeça e grita (talvez a melhor palavra aqui fosse “uiva”) sofregamente, “NÃO! NÃO! NÃO! AHHH!”, enquanto é amparado por um vizinho de cadeira, quase simultaneamente ouve-se ao fundo alguém fazer “sshh, ssshhh”, como se estivesse num teatro ou cinema. Isso sim, senhor Brito, é falta de sensibilidade.